domingo, 12 de setembro de 2010

Angola e Brasil: Realidade, Ficção e Democracia Racial

l Priamo Marratzu


  








Índice


Resumo
A colonização, tal como foi praticada pelos Portugueses, deixou marcas originais em varios continentes. Partindo desta consideração, Angola e Brasil oferecem dois casos interessantes de manipulação na construção da realidade. Analisamos a informação portuguesa na guerra colonial em Angola e o mito da democracia racial no Brasil.
1 Realidade e ficção em Angola
O caso angolano foi um exemplo bem sucedido de sociedade euro-africana. Isso porque baseado principalmente em dois pilares: mestiçagem e aculturação, sendo a figura do assimilado típica da sociedade local. As razões da assimilação eram múltiplas: a combinação da doença com o lucro fácil proveniente do comércio de escravos não era de molde a proporcionar a emigração de famílias portuguesas para Angola ,os portugueses, na sua maioria, esposaram mulheres indígenas e os seus descendentes eram, geralmente, educados à maneira portuguesa e na religião católica(Russell-Wood, 1998).

O aumento da emigração registou-se só depois da Segunda Guerra Mundial, que faz
subir o número de colonos em Angola, de cerca de 44 000 em 1940 para 173 000 em
1960. Dois factores terão levado a esta nova situação: em primeiro lugar, o relativo de-
senvolvimento económico, que permitiu a instalação dos colonos e, secundariamente,
a propaganda imperial do Estado Novo (Alexandre, 2000:142).
Até na área cultural houve influência, porque os portugueses foram os transmissores
de costumes europeus a outros continentes como a África, a Ásia e a América. E pode-
se admitir que no quadro, não já da ideologia expressa na legislação ou nos livros, mas
dos contactos raciais efectivamente estabelecidos, a realidade é outra: aí tornar-se-ia evi-
dente a capacidade do português para vive em harmonia com o negro e até para se inte-
grar na sua cultura1. Isso não quer dizer que tudo correu bem, porque é verdade que só a partir de 1961, o desenvolvimento do sistema educativo vai permitir uma maior mistura das raças e o crescimento do número de africanos participantes na sociedade euro-africana. O esforço desenvolvido pela classe intelectual angolana no sentido da afirmação da realidade cultural africana esbarrou no duplo obstáculo: a ausência de instrumentos e de um quadro autónomo de e para a respectiva expressão (Jorge, 1998:59).
Assim, se por um lado havia a tendência para a miscigenação, por outro, todas as ten-
tativas para denunciar o fosso que se cavava entre brancos e pretos, por força da explo-
ração colonialista, esbarrava num muro de silêncio erguido pela censura e pela polícia
política (Barradas, 2001:458).

É oportuno também sublinhar que se a miscigenação foi, de certa forma, a tónica
geral da presença portuguesa nos trópicos, nem todas as sociedades que conheceram
tais processos beneficiaram, porém, de atenção bastante para que o ensino formal aí
instaurado lhe permitisse alcançar o estádio de evolução da alta cultura (Venâncio,
1996:17)2

Outros problemas de natureza social apareciam em Angola: a aritmética étnica, que
aponta também aqui duas unidades principais proporcionalmente equivalentes (Am-
bundos e Umbundos), corresponde à bem conhecida fractura histórica do imparável conflito armado (Saccheti, 2001: 241).

E há aqui quem saliente que em Angola: "sempre existiu um divórcio entre a so-
ciedade rural e a sociedade urbana . Os grandes centros urbanos foram construídos ao longo da costa, com o desenvolvimento das feitorias (...)o conflito entre o MPLA, por um lado, e a UNITA e a FNLA, por outro, é o conflito entre dois modos de organização social: o MPLA representava a sociedade urbana ou urbanizada, enquanto que a FNLA e a UNITA representavam a sociedade rural, ruralizada ou emigrada"(Jorge, 1998:275-
276).

No contexto mais amplo, sobretudo dentro das Nações Unidas, a política portuguesa foi contestada pelos africanos e pelos europeus. A administração instalou então o regime de terror, e ficou preso Agostinho Neto, presidente do MPLA. No entanto, pode-se afirmar que a guerra contra o colonialismo foi essencialmente uma guerra rural, feita por rurais com o apoio de uma parte da população dos
centros urbanos. Quando existe um contacto entre culturas diferentes, como eram as portuguesa e angolana, há uma variável decisiva: a vontade popular, que seja qual for o seu grau de representatividade, depende, em grande parte, de uma adequada e persistente acção sobre os mecanismos que influenciam a opinião pública.

Continua...

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